Professor do Departamento de História da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) indica 10 obras para quem deseja começar a estudar o Integralismo
Por Odilon Caldeira Neto
Não é de hoje que os estudos sobre o integralismo estão em franca expansão. Isto pode soar contraditório, pois em negação das perspectivas de seus militantes, a Ação Integralista Brasileira (AIB) não chegou ao poder em 1937, assim como, nas décadas posteriores, as demais siglas que lhe sucederam não obtiveram grande protagonismo. Contudo, estudar o integralismo é não apenas tentar compreender os caminhos de suas diversas organizações políticas, mas discutir também as tentativas de reconstruir a identidade nacional e, além disso, propor ou impor um modelo autoritário para a sociedade brasileira.
Integralistas da cidade de Viçosa do Ceará na década de 1930. Da esquerda para direita: João Evangelista de Miranda (comerciante), Afonso Deocleciano Marques (dentista), Bastos Sampaio (tabelião), José Vitor Fontenele Filho (professor Juca), Vicente Miranda Filho (comerciante). Imagem: Domínio Público / Wikipédia.
1. TRINDADE, Hélgio. Integralismo: o fascismo brasileiro da década de 1930. 3ª ed. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2016.
Originalmente produzida como tese de Doutorado na Université Paris 1, a obra de Hélgio Trindade é mais que parte da bibliografia pioneira sobre o tema, mas também referência quase obrigatória aos estudiosos dos movimentos autoritários na História Política brasileira. O autor aborda desde as relações intelectuais e políticas de Plínio Salgado, principal líder dos “camisas-verdes”, até a efervescência política das primeiras décadas do período republicano, especialmente em dimensões conservadoras, como as Ligas Nacionalistas e o Centro Dom Vital. Além das origens intelectuais e o processo de formação da AIB, a obra trata também da estrutura, da organização e das tendências internas, assim como de questões menos “oficiais”, como as disputas de poder da alta hierarquia. A primeira edição da obra, publicada na década de 1970, marca o esforço de diversos autores e autoras em compreender o fascismo brasileiro na década de 1930, assim como alguns de seus “legados” ao regime autoritário iniciado em 1964. Mais recentemente, em…
2. TRINDADE, Hélgio. A tentação fascista no Brasil: imaginário de dirigentes e militantes integralistas. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2016.
Hélgio Trindade retoma as discussões sobre a natureza fascista do Integralismo, além de trazer a público diversas entrevistas realizadas com militantes e dirigentes integralistas, parte substancial do trabalho que deu corpo à sua obra seminal.
3. MAIO, Marcos Chor. Nem Trotsky, nem Rotschild: o pensamento anti-semita de Gustavo Barroso. Rio de Janeiro: Imago, 1992.
Seja pela liderança ou por constituir a tendência majoritária na Ação Integralista Brasileira, grande parte das obras sobre o integralismo centram esforços na análise em torno de Plínio Salgado. Já alguns estudiosos buscaram analisar outros aspectos, fosse as demais figuras da alta hierarquia dirigente da AIB – como foi o caso do escritor Gustavo Barroso–, mas também temáticas como o antissemitismo, que se tornariam elementos problemáticos na História do integralismo. A obra de Marcos Chor Maio é uma das pioneiras na análise em torno do antissemitismo em Gustavo Barroso, que foi Chefe das Milícias da AIB e uma espécie de líder das tendências mais radicais da organização. Por essa razão, é não apenas uma análise sobre o antissemitismo barrosiano ou mesmo do impacto dessa questão no integralismo dos anos 1930, mas um valioso estudo sobre a questão antissemita no Brasil.
4. GERTZ, René. O fascismo no sul do Brasil: germanismo, nazismo, integralismo. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1987.
A obra de René Gertz é fundamental por ao menos três aspectos. Em primeiro lugar, trata do integralismo em uma perspectiva regional, auxiliando a evidenciar o fato de que o movimento adquiriu feições variadas com suas determinadas particularidades em diversas localidades do país. Além disso, trata de duas perspectivas que povoam o imaginário coletivo sobre o tema a partir de uma abordagem criteriosa sobre a relação nem sempre amistosa dos integralistas com fascistas e nazistas e, por fim, o estudo sobre as supostas conexões entre etnicidade de imigrantes e a vinculação com movimentos de cunho autoritário. Em termos historiográficos, o livro é um bom exemplo das possibilidades em observar as particularidades do “regional” para entendermos as vicissitudes do “nacional”.
5. CALIL, Gilberto. O Integralismo no Pós-Guerra: A Formação do PRP (1945-1950). Porto Alegre: EdiPUCRS, 2001.
6. ____________. Integralismo e Hegemonia Burguesa: a intervenção do PRP na política brasileira (1945-1965). Cândido Rondon: Ed. UNIOESTE, 2010.
As duas obras de Gilberto Calil tratam do Partido de Representação Popular, a principal organização integralista existente entre 1945 e 1965. São no mínimo duas imprescindíveis contribuições trazidas pelo historiador. Em primeiro lugar, observa o processo de rearticulação do integralismo após o Estado Novo, quando foi posto à ilegalidade, assim como caracterizado como “quinta-coluna” durante a Segunda Guerra Mundial. O retorno à democracia impôs aos integralistas a necessidade de moldar parte dos ideais da AIB às condições democráticas do período, ao mesmo tempo em que era prudente retomar aspectos doutrinários e simbólicos do integralismo nos anos 1930. Além dessa questão, Gilberto Calil analisa com profundidade a atuação do PRP em seu período de existência, inclusive a contribuição de integralistas, militantes e dirigentes, no processo do golpe de 1964.
7. GONÇALVES, Leandro Pereira. Plínio Salgado. Um católico integralista entre Portugal e o Brasil (1895-1975). Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2017 (no prelo).
A obra de Leandro Pereira Gonçalves é uma das importantes contribuições da historiografia mais recente do integralismo. Ao analisar os itinerários político e intelectual de Plínio Salgado, o autor desloca o centro analítico sobre o líder integralista para além do período da formação e atuação da Ação Integralista Brasileira. Empreende um exaustivo estudo sobre as relações entre a ideologia integralista em suas diversas fases e o conservadorismo, o catolicismo e as redes transnacionais de interação política e ideológica. Assim, observa o impacto de movimentos como a Action Française, o Integralismo Lusitano e a democracia-cristã nas trajetórias plinianas. Ao tratar sobre o exílio de Plínio Salgado em Portugal, o autor analisa as relações do antigo líder da AIB com o salazarismo, assim como a maneira como essas colaborações impactariam não apenas no processo de construção do Partido de Representação Popular, mas também a atuação política de Plínio Salgado durante a ditadura civil-militar.
8. BARBOSA, Jefferson Rodrigues. Chauvinismo e Extrema-direita: crítica aos herdeiros do sigma. São Paulo: Ed. Unesp, 2016.
A obra de Jefferson Rodrigues Barbosa é a mais recente e valiosa contribuição para os estudos do integralismo na contemporaneidade, desde as modificações discursivas até as novas estratégias e as disputas entre os diversos grupos existentes. Para isso, o autor trata sobre o fim do Partido de Representação Popular (PRP), a ação intelectual dos “Águias brancas” (membros dos Centros Culturais da Juventude) e os elos com os atuais militantes integralistas. Fazendo jus aos novos tempos, a obra traz uma apurada análise sobre o uso da internet pelos integralistas, ferramenta que é utilizada seja como plataforma de divulgação, mas também como instrumento de formação política para os novos e antigos militantes do sigma, além de veículo de interação com outras organizações da extrema-direita brasileira.
9. SILVA, Giselda Brito. Estudos do Integralismo no Brasil. 2ª ed., Porto Alegre: EdiPUCRS, 2016.
As obras de coletânea são um bom caminho para se observar as novas produções na historiografia de um tema, assim como o diálogo entre novos pesquisadores e aqueles já consagrados. Publicada em 2007, “Estudos do Integralismo no Brasil”, organizada por Giselda Brito Silva e lançada recentemente em segunda edição, é pioneira na área. Além do pioneirismo, a obra traz importantes reflexões sobre diversos aspectos e objetos de estudos sobre o integralismo, fornecendo não somente um apanhado geral dos temas afins, mas também indicando novas possibilidades de pesquisa aos interessados na área.
10. BERTONHA, João Fábio. Bibliografia orientativa sobre o integralismo (1932-2007). Jaboticabal: FUNEP, 2010.
Fruto de anos de pesquisas sobre o integralismo no Brasil e suas relações com o fascismo internacional, João Fábio Bertonha traz uma contribuição essencial para os estudiosos do tema e demais interessados: um guia bibliográfico sobre o integralismo, que consegue fornecer um rigoroso apanhado sobre as obras destinadas a analisar o integralismo, mas também publicações diversas como coletâneas, artigos, anais de evento, etc. Embora as produções sobre o integralismo continuem em franco crescimento, a obra torna-se indispensável para as diversas gerações de pesquisadores do integralismo brasileiro e do fascismo de uma maneira geral. A obra marca, assim, não somente o domínio do autor em um campo tão fecundo e diverso, mas também aquilo já afirmado, ou seja: os estudos sobre o integralismo estão em franco e contínuo desenvolvimento.
Odilon Caldeira Neto é professor substituto do Departamento de História da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Doutor em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGH-UFRGS, 2016), com estágio de doutoramento (investigador visitante júnior) pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-Ulisboa). Em Portugal, foi bolsista da Fundação Calouste Gulbenkian e da CAPES, no Brasil. Mestre em História pela Universidade Estadual de Maringá (PPH-UEM, 2011), Especialista em História Social e Ensino de História pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), Graduado em História (bacharelado e licenciatura) pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Autor de “Sob o Signo do Sigma: Integralismo, Neointegralismo e o Antissemitismo” (Eduem/2014). Tem experiência na área de História, com ênfase em História Contemporânea e do Tempo Presente, atuando principalmente nos seguintes temas: Radicalismos de Direita, Conservadorismo Político, Autoritarismos, Nacionalismos, Fascismos, Neofascismos e Antissemitismo. Coordenador e investigador da Rede Internacional de Investigação “Direitas, História e Memória” (http://direitashistoria.net), Secretário do GT Nacional “Direitas, História e Memória” da ANPUH, Pesquisador Associado ao Grupo de Trabalho “Derechas contemporáneas: dictaduras y democracias” (Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, CLACSO). Contato: odiloncaldeiraneto@gmail.com.
Via Café História
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